Título: Madame Bovary

Autor: Gustave Flaubert
Editora: Martin Claret
Tradução: Herculano Villas-Boas
Páginas: 398
Ano: 2015
ISBN: 9788544000373
Onde comprar: Amazon – Saraiva

Sinopse: Texto de suma importância, “Madame Bovary” é uma leitura essencial, sendo considerado um dos melhores romances da literatura, sendo, provavelmente, o melhor dos livros do romance realista de caráter psicológico do século XIX. Para mostrar seu mundo, Flaubert põe em cena uma personagem em total desacordo com sua realidade, com sua posição social e com seu sexo. É nessa personagem que se centrarão as ações desenvolvidas na narrativa e os principais dilemas da obra.

Resenha: Charles Bovary é um garoto do interior que nunca teve muitas ambições na vida e, na verdade, Charles sempre quis uma vida tranquila e sossegada. Sua educação começou um pouco mais tarde do que o normal, pois seus pais o mandaram para a escola o mais tarde possível e por isso teve alguns problemas em sua época de estudos. Principalmente com as provocações dos outros alunos, mas Charles sempre deixava para lá e não se metia em encrencas.

“Ao cair da tarde, na sala de estudos, ele arregaçou as mangas na carteira, arrumou os poucos pertences, ordenou cuidadosamente os seus papéis. Nós o vimos trabalhar atentamente, procurando todas as palavras no dicionário, penando muito. Sem dúvida, graças a essa boa vontade que demonstrava, ele não foi rebaixado à classe anterior, porque, se sabia razoavelmente os seus deveres, as suas palavras e atitudes não eram lá muito elegantes.” p. 24.

Chales até que estava indo bem, mas vindo de uma família possessiva, ao final do terceiro ano, seus pais o tiraram da escola e o levaram para estudar medicina. A mãe cuidou de tudo para que Charles pudesse estudar e morar longe de casa. Mas ele não conseguia entender nada, pois eram matérias e matérias de todos os tipos e infindáveis. Mas ninguém poderia dizer que não era esforçado, pois mantinha seus cadernos em ordem e seguia todos os cursos, além de não perder uma única visita médica sequer. Mas logo seu entusiasmo mudou, começou a perder as visitas, a faltar e assim, pouco a pouco, não voltou mais ao curso. Descobriu a preguiça, os bares e se apaixonou pelo dominó. Virou cliente assíduo de uma taverna pública e conheceu os prazeres sexuais.

“Era como a iniciação à sociedade, o acesso aos prazeres proibidos; e, introduzindo-se por Béranger, aprendeu a fazer ponche e enfim conheceu o amor. Graças a todos esses trabalhos preparatórios, fracassou completamente no exame para tornar-se oficial da saúde.” p. 30.

Mas Charles era persistente e, após seu arrependimento, contou tudo para sua mãe, que o perdoou. Então, resoluto, estudou, recuperou o tempo perdido e conseguiu passar no exame com uma ótima nota, para alegria de sua mãe. Ainda sendo guiado pela senhora Bovary [mãe], Charles foi praticar medicina em Tostes e lá também se casou com uma viúva que tinha quarenta e cinco anos e mil e duzentas libras de renda.

Obviamente, que Charles não era feliz em seu casamento arranjado pela mãe, mas resignado, levava a vida como podia. Uma noite, vieram busca-lo para uma emergência em uma fazenda longe de Tostes, pois o Sr. Rouault, que provavelmente era um dos agricultores mais ricos daquelas paragens, havia quebrado a perna e implorava para que Charles o atendesse. Como não poderia negar, Charles foi ao encontro daquele enfermo, e mal sabia ele que logo sua vida iria mudar completamente.


“Uma jovem, vestida de finíssima lã azul adornada com três folhos, chegou à porta da casa para recepcionar o Sr. Bovary, levando-o a entrar pela cozinha, onde flamejava grande fogo.” p. 34.

O pai Rouault era um viúvo que morava com sua filha na fazenda Bertaux. Emma era de uma rara beleza, que encantou Charles Bovary. Tanto que, após ter atendido o pai de Emma e prometido voltar somente dali a três dias, voltou mesmo foi no dia seguinte e depois mais duas vezes por semana, regularmente, sem contar as visitas inesperadas. Mas, a senhora Bovary, já desconfiada de tantas visitas descobriu o  motivo e começou a atormentar a vida de Charles. Sua mulher Héloïse, o fez jurar que não iria mais voltar aos Bertaux, e, obviamente, Charles obedeceu.

Charles ainda teria que passar por mais mudanças em sua vida, pois de uma forma rápida, sua mulher desfaleceu em sua cama e morreu. Mas quando pai Rouault ficou sabendo da desgraça que atingira o médico, foi visitá-lo com setenta e cinco francos, pelo pagamento pela cura de sua perna, e um peru. Tentando consolar o recente viúvo, o pai Rouault lhe disse que Emma sentia falta de Charles, o que foi suficiente para que ele voltasse a visitar aquela linda mulher.

Emma, havia crescido em meio aos romances. Foi educada em um convento e sempre imaginava diversas situações onde existiam amantes, amores, namorados, damas perseguidas e os heróis que sempre vinham no auxílio da mocinha da história. E era assim que ela via o amor, um grande romance, onde seu marido seria seu amante, o aventureiro e o herói. Quando Emma conheceu Charles Bovary, ela imaginava que tivesse encontrado seu príncipe encantado e quando ele fez o pedido, ela não poderia ter ficado mais feliz.


“Emma, ao contrário dos outros, desejaria casar-se à meia-noite, à luz de velas; mas o pai Rouault não entendeu nada desse desejo. Afinal, aconteceu o casamento, com a presença de quarenta e três pessoas, que ficaram dezesseis horas à mesa, e a festa recomeçou no dia seguinte, e um tanto também nos dias seguintes.” p. 46.

A realidade do casamento de Emma e Charles, mostrou-se totalmente diferente daquilo que ela esperava. Nada daquilo era como ela havia imaginado. Seu marido a idolatrava, sem dúvida, mas isso não bastava. Já logo no começo de sua vida de casada, a antipatia entre sogra e nora ficou mais do que evidente e isso também era um problema para Emma. Ela não entendia como as coisas não poderiam ser como nos romances que ela havia lido e sonhado por tantos anos. Aquela frustração começou a aumentar e a cada dia ela se distanciava emocionalmente de Charles. E foi nesses desejos de romances inebriantes e aventureiros que Emma decidiu que precisava mudar as coisas para ela.

“Perguntava-se se não haveria meios, através de outas reuniões do acaso, de encontrar algum outro homem; e buscava imaginar quais seriam esses eventos que não aconteceram, essa vida diferente, esse marido que ela jamais conheceria. De fato, nenhum de seus amantes imaginários assemelhava-se a este marido.” p. 68.

Opinião: Muito tempo se passou desde a minha primeira leitura de Madame Bovary de Gustave Flaubert e mesmo depois de anos e quase sem me lembrar de muitas coisas, posso dizer que a leitura foi, deveras, gratificante. Flaubert tem uma escrita sensacional que te absorve de uma forma tão imersiva que é muito difícil parar de acompanhar as mazelas de Madame Emma.


Além de ser um marco no estilo de romance, trazendo à tona o realismo literário, Flaubert apresenta vários tabus da época em que foi escrita essa obra tão importante. O autor incendeia diversas facetas da sociedade da época com uma crítica dura e realística, como o próprio nome do estilo literário já o diz, sem “romancear” nada nem ninguém, jogando na cara do leitor aquilo o que o Romantismo, geralmente, escondia: A vida depois do amor, das paixões e do casamento. Joga em pauta a rotina sufocante de um casal emergente em um ambiente de cidadezinha pequena.

O grande choque que ocorre entre o casal Bovary é determinante para uma justificativa das ações que Emma tem ao longo da história. Seu marido Charles é o típico homem apaixonado e cego pela esposa, que tem uma profissão que não ama, mas conformado como é, inclusive em todos os aspectos de sua vida, segue fazendo o melhor que pode, mas sem demonstrar qualquer vontade de melhora ou mudança. Emma, por sua vez, cresceu vivendo através de seus romances, onde via todo homem como um herói que a amaria e a levaria a viver emoções por toda a sua vida, principalmente depois do casamento, o que seria um sonho.

Mas, quando a dura realidade da vida cotidiana em uma cidade do interior da França e com um marido que se mostra “insuficiente” e “incompatível” com seus sonhos e desejos infindáveis e romantizados, a grande frustração ataca impiedosamente nossa protagonista fazendo-a ter desejos e sonhos nada ortodoxos para a época em si.

A partir daí, o autor tece uma crítica mordaz a sociedade e ao papel da mulher, que sempre foi o de submissão completa. Mesmo que as situações descritas no livro sejam vividas na pele da personagem principal, uma mulher, não se pode esquecer de que a escrita é masculina e sempre vai lhe trazer aquela impressão, por menor que seja, que as ações de Emma, são, na verdade, as de um homem não só daquela época como na de hoje.


Claro que isso não quer dizer que o relatado em Madame Bovary não acontecia, mas, para mim, essa impressão de troca de papéis ainda persiste nessa minha segunda leitura da máxima de Flaubert. Mesmo assim, ele, o escritor, evidenciou as auguras de ser uma mulher no mundo dos homens e de ter desejos não correspondidos pela vida e por suas escolhas. Pode-se perceber bem isso analisando a troca de caráter do casal Bovary onde o homem tem aquela atitude resignada e a mulher uma atitude mais desafiadora, mesmo que um tanto sonhadora.

Outra coisa interessante em Madame Bovary, é a demonstração da cobrança, também pela vida, de seus atos e escolhas, onde o autor deixou bem claro que toda ação tem sua respectiva reação, seja ela imediata ou não, e, por mais que sua obra seja um marco da literatura realista, qualquer leitor ainda vai encontrar pequenas notas do romantismo no decorrer da história, o que não deixa de ser surpresa ante ao ineditismo do Realismo até então.

A família também fica bastante evidenciada na história, mas de uma maneira bastante nua, crua e totalmente despida de qualquer véu romântico como era de costume até então. No romance de Flaubert as relações familiares são mostradas da forma mais verdadeira possível e porque não dizer, comum naquela sociedade um tanto fria da época, acostumada a seguir conceitos morais e muitas vezes calcados apenas em aparências.

Podemos também encarar a personagem de Emma como a personificação da frustração dos seres humanos em qualquer época que seja, pois ela demonstra claramente o insaciável desejo de realizações pessoais, onde muitos sequer chegam perto de acontecerem; a grande resistência às mudanças e adequações, que chegam com o progresso e a necessidades de todas as novas gerações entre outros fatos, e, em meio a tudo isso, o desprezo por tudo aquilo que se conseguiu em vida, evidenciando o grande estado antagônico em que o ser humano vive.


Madame Bovary de Gustave Flauber, publicado pela editora Martin Claret,  não é apenas um dos romances clássicos que inaugura o Realismo literário, é também uma profunda crítica sócio-econômica-cultural que evidencia a psicologia comportamental da vida familiar, incluindo todas as suas mazelas sem se utilizar dos tradicionais, até então, “panos quentes”.

Tenho certeza que muitos dos que já leram essa fantástica obra da literatura mundial, hão de concordar comigo que Madame Bovary é IMPERDÍVEL, isso para não dizer OBRIGATÓRIO.

Sobre a edição: Mais uma vez a editora Martin Claret surpreende os seus leitores com uma edição no mínimo belíssima. Além dos atributos da escrita em si e todo o significado que Madame Bovary retrata, como dito acima, a editora preparou uma edição com um capricho todo especial para seus leitores, onde o formato escolhido foi o de 23×16, capa dura “inflada” [aquela fofa ou fofinha…kkkkk] com acabamento fosco, folhas amareladas e fonte agradável.


A edição ainda conta com algumas ilustrações e artes entre os capítulos e partes do livro e muitas notas de rodapé. Realmente, a editora Martin Claret caprichou bastante nessa edição espetacular e lindíssima de Madame Bovary, que cá entre nós, merecia mesmo uma roupagem como essa.

O autor, com certeza, ficaria bastante orgulhoso de ver sua obra reverenciada com tanta pompa como essa. Mais uma edição que a Martin Claret fez por merecer, que vale cada centavo, agrada os olhos, a mente e o coração. Aproveitem.

Sobre o autor: Gustave Flaubert nasceu em Rouen em 12 de dezembro de 1821. Escritor importante, marcou a literatura francesa pela profundidade de suas análises psicológicas, seu senso de realidade, sua lucidez sobre o comportamento social e pela força de seu estilo em grandes romances como Madame Bovary, A Educação Sentimental, Salambô e também em seus contos como Trois Contes. Flaubert faleceu em 08 de maio de 1880 aos 58 anos. [fonte: Wikipédia].