Sinopse: -Dr. Stockmann – Muito bem, caros concidadãos. Nada mais direi sobre nossos governantes. Não pretendo criticá-los mais, dizer-lhes mais e mais verdades, não, não mesmo! […] Estou certo de que todos esses reacionários, todos esses velhos destroços de um mundo que está desaparecendo terão o seu fim natural, cedo ou tarde. Não precisaremos apressar o seu desaparecimento, pois eles acabarão por si mesmos. Não é tampouco essa gente que constitui o perigo mais iminente para a sociedade. Não, não são eles os mais perigosos destruidores das forças progressistas, nem são eles os mais perigosos inimigos da verdade e da liberdade! Gritos por todos os lados – Quem são? Quem são? Diga! Dr. Stockmann – Sim, podem ficar descansados, eu direi! Foi esta justamente a grande descoberta que fiz ontem. (Alteando a voz.) O inimigo mais perigoso da verdade e da liberdade, entre nós, é a enorme e silenciosa maioria dos meus concidadãos. Esta massa amorfa, é ela! (Trecho de Um inimigo do povo) UM LIBELO CONTRA A HIPOCRISIA E A UNANIMIDADE Um inimigo do povo foi publicado em Copenhague em 1882 e estreou no Teatro Nacional de Oslo em 13 de janeiro de 1883. Imediatamente foi traduzido para dezenas de línguas e encenado e publicado em quase toda a Europa, numa repercussão digna dos grandes autores franceses que monopolizavam a dramaturgia da época. A estreia em Paris foi marcada por grandes manifestações no teatro de apoio às ideias anarquistas. A enorme repercussão da peça motivou longos e apaixonados artigos do deputado socialista Jean Jaurès e do deputado esquerdista e grande intelectual do seu tempo Georges Clemenceau. Em 1898, voltou a ser apresentada em Paris em meio ao célebre processo Dreyfus, quando as sessões da peça eram seguidamente interrompidas com aclamações de protesto contra o Estado e de apoio a Ibsen e Zola, que pontificava na época com seu célebre libelo libertário J’accuse a favor de Alfred Dreyfus. Um inimigo do povo é uma obra-prima sobre as contradições humanas e a falência do indivíduo frente à unanimidade. Mesmo diante da vontade de praticar o bem comum, o dr. Stockmann entra em choque com os interesses mesquinhos da cidade. Vítima da maioria e da unanimidade, o homem que queria salvar a cidade torna-se o inimigo do povo. Estas ideias de Ibsen aproximavam-se muito das ideias anarquistas, que tinham amplo apoio de importantes segmentos intelectuais e políticos da sociedade da época. A peça é uma impiedosa crítica às elites, aos governos, aos partidos e ao pensamento único. Os Editores”
Resenha/Opinião: Escrito pelo dramaturgo norueguês Henrik Ibsen e publicado originalmente em 1882, “Um inimigo do povo” é uma peça teatral e foi publicado no Brasil pela L&PM.
Logo no início da história conhecemos o Dr. Stockmann, um médico de uma pequena cidade localizada na Noruega. Stockmann é o médico de uma estação balneária, estação essa que foi idealizada por ele em conjunto com o seu irmão Peter, o prefeito da cidade. A estação balneária serviu para atrair turistas, ou melhor, pessoas que buscam tratamento médico. Com o advento da estação e aumento do fluxo de pessoas a cidade prosperou economicamente, o próprio Stockmann passa a ser requisitado e bem-visto pelas pessoas na cidade, e dessa forma acaba recebendo habitualmente muitas pessoas em sua casa.
Com o passar do tempo o médico desconfia que algo está errado nas águas do balneário, ele acredita que elas estão contaminadas e por isso envia uma amostra para um laboratório. Após a análise, o veredito chega nas mãos do Dr. Thomas Stockmann e o resultado não é nada animador, pois a água realmente foi contaminada e isso ocorreu por uma encanação feita em um local impróprio, mas também pelo curtume que circunda a cidade.
Com o resultado em mãos, Stockmann compartilha as informações ao editor e subeditor do jornal a “Voz do Povo”, respectivamente Hovstad e Billing. Os responsáveis pelo jornal acreditam que o resultado deve chegar ao conhecimento dos cidadãos, principalmente para que eles não sejam prejudicados ou mesmo para que o governantes não continuem explorando o local e abusando do poder. Contudo, Stockmann pede aos responsáveis pelo jornal que aguardem um pouco, pois ele pretende enviar o relatório ao seu irmão e prefeito da cidade para que tudo possa ser resolvido de forma pacífica e correta.
O prefeito desacredita o irmão e diz que o mesmo está alarmando a cidade por pouca coisa, além disso, essa notícia pode abalar a cidade e prejudicar os cidadãos. Contudo, Stockmann não aceita a posição do irmão e vai contra ele, desse momento em diante começa uma verdade luta pelo poder.
Henrik Ibsen apresenta em “Um inimigo do povo” uma crítica a sociedade, o jogo sujo da política, a corrupção, a luta pelo poder, mas também o quanto os políticos abusam do seu poder em busca de vantagens sejam elas políticas ou econômica. Outro aspecto interessante é que durante a leitura nos deparamos o quanto a ideologia política é capaz de cegar o ser humano, o quanto ficamos cegos diante de determinadas situações apenas pelo viés político, por aquilo que acreditamos independente de estar certo ou errado. Esse é um livro dividido em cinco atos e posso dizer tranquilamente que foi uma leitura rápida e fascinante.
Sobre o autor: Henrik Ibsen nasceu em 20 de março de 1828, filho de Knud e Marichen (Altenburgh) Ibsen, em Skien (Noruega) – uma cidade costeira de cerca de 3 mil habitantes cuja principal atividade econômica era a extração de madeiras. Com exceção de seu pai, que era proprietário de um armazém e de uma destilaria, os parentes por parte de pai foram todos marinheiros e capitães de navios. O irmão mais velho morreu um mês antes do nascimento de Henrik, mas seus pais tiveram mais quatro filhos, três homens e uma mulher, e todos viveram até a idade adulta. A Noruega esteve sob o poder da Dinamarca de 1387 a 1814, quando, depois de poucas semanas de independência, foi subjugada pela Suécia. Na época em que Henrik nasceu, era uma região rural muito primitiva, culturalmente subjugada pela Dinamarca, sem nenhuma vida intelectual própria. Henrik Ibsen nasceu num meio familiar conservador e feliz; seu pai era um próspero comerciante enquanto sua mãe cuidava do lar e tocava piano. A vida complicou-se quando em 1834 as autoridades governamentais mandaram fechar a destilaria, arruinando seu pai que foi obrigado a vender tudo o que tinha, das terras até a casa e a mobília. Dos 13 aos 15 anos, Ibsen cursou uma pequena escola particular, onde suas matérias favoritas eram religião e história clásica. Em 27 de dezembro de 1843, foi de navio para Grimstad, uma cidade de 800 habitantes ao sul, para trabalhar como assistente de farmacêutico.
A partir daí Ibsen começa a levar sua vida, retornando a casa paterna somente em rápidas visitas e contatos ocasionais. Durante os seis anos que esteve em Grimstad, trabalhou arduamente na farmácia e aproveitou o seu pouco tempo livre lendo, pintando e escrevendo poesias. Em Grimstad, como em Skien, as peças de teatro eram encenadas por companhias de teatro itinerantes, e Ibsen assistiu algumas delas, criando imediatamente um fascínio pela dramaturgia. Em 1846, com 18 anos, ele teve um filho com uma empregada doméstica de 21 anos que trabalhava na casa de seu chefe (embora tenha sido obrigado a contribuir financeiramente para os estudos do filho até este completar 18 anos, nunca teve contato com a criança).
Aos 20 anos, Ibsen já tinha se tornado um livre pensador em questões de religião e política, e estava completamente excitado com a onda de revoluções populares que surgiam por toda a Europa, em 1848, e ameaçavam os velhos governos. Ele escreveu poemas nos quais exaltava os húngaros que lutavam por sua libertação e instigava os seus companheiros escandinavos a se levantar contra os seus opressores. No princípio de 1849, escreveu Catiline, sua primeira peça, um drama em versos brancos que lembrava Shakespeare no estilo e na estrutura, embora Ibsen negasse qualquer influência direta. Catiline é tradicionalmente apresentado como um conspirador de cujas tramas Roma foi salva pela ação de Cícero; na versão de Ibsen, ele é um revolucionário e um herói.
Ficha técnica:
Título: Um inimigo do povo
Autor: Henrik Ibsen
Tradução: Pedro Mantiqueira
Editora: L&PM Editores
Páginas: 160
Ano: 2022
ISBN: 9786556662565
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